Aluna do curso técnico em Guia de
Turismo do Senac Aclimação, Audmara Veronese, desenvolve um roteiro sensorial
para pessoas cegas e de baixa visão em Espirito Santo do Pinhal.
Atenta a escassez de produtos turísticos
voltados às pessoas cegas e de baixa visão, bem como à emergência do turismo de
experiência, Audmara criou um roteiro sensorial em Espirito Santo do Pinhal. O
piloto faz parte de seu Projeto Integrador, idealizado no desenvolvimento das
competências associadas ao profissional guia de turismo.
Unindo a Secretaria de Turismo local, que a conheceu
num evento da área; empresários locais, que acolheram sua ideia em visitas
preliminares, a Fundação Dorina Nowill e instituições representativas do trade turístico, como a Federação
das Empresas de Transportes de Passageiros por Fretamento do Estado de São
Paulo (FRESP), que
acreditaram no projeto, a aluna articulou uma rede de pessoas interessadas em
investir no segmento. E a experiência piloto foi um sucesso, como descreverei a
seguir.
Por conviver há mais de 15 anos com
pessoas cegas, Audmara imprimiu sua marca desde a idealização à implementação
do roteiro. Já no início, fez uma dinâmica em que todos os participantes se
apresentaram, contaram um pouco de si e do interesse em fazer um passeio para
conhecer a produção de café. Vieram as lembranças da infância, os semblantes de
alegria compartilhados e os causos curiosos associados à vida cotidiana.
Atenta, a futura guia descreveu como
estava vestida e os adereços que escolheu para aquele passeio. Retomou as
conversas iniciais de planejamento com os participantes, as histórias de cada
um.
O guiamento foi uma espécie de
curadoria, pois a aluna tanto se preocupou com a concepção de um roteiro
desenhado pelos sentidos, como fez com que os participantes expusessem seus
talentos artísticos. Um dos participantes criou algumas trovas e as declamou
durante o passeio.
O primeiro atrativo foi a Fazenda Retiro Santo Antônio, apresentada por
seu proprietário, Jefferson Adorno, munido da hospitalidade mais genuína.
Recebeu o grupo desde a chegada do ônibus e na casa administrativa preparou uma
mesa com café, leite e bolos de fubá e milho. Acolheu todos contando sua
trajetória e sobre a produção de um café incluso num projeto em harmonia com o
meio ambiente, pela preservação das nascentes, mata nativa e fauna local. Ali,
Aud entregou as lembranças, os chapéus de palha para caminhada e comentou que
havia impresso o nome de todos os participantes e apoiadores. Assim, visitamos
a Capela de Santo Antônio, construída em 1950, e fomos ao cafezal. Já com a
lona branca no corredor entre os pés de café, tiramos as sementes dos
cafeeiros. Jefferson ensinou todos como faz a colheita, tratamento, estoque
etc. E como uma surpresa, deixou que o grupo plantasse uma árvore nativa para
registrar o momento. Os participantes cegos e de baixa visão pegaram na terra,
tocaram o vegetal, afofaram o solo e sorriram. Dalí seguimos até a sala do
moinho, onde se produz o fubá. Pegamos o milho, trituráramos e sentimos o pó
que descia entre as pedras. Fomos para o almoço.
Nossa refeição foi no centro da cidade, com alguns trechos em
paralelepípedo, outros com asfalto. Na paisagem, edificações históricas e bem
preservadas descritas pela Audmara. Almoçamos três opções de pratos,
previamente apresentados pela aluna, todos acompanhados com saladas já picadas
e temperadas.
À tarde, fomos na Cafeteria Loretto.
Heitor Palermo Jr., gerente do estabelecimento, arrumou uma mesa para que todos
sentissem os tipos de sementes em seus estágios de maturação. Apreciamos o café, conversamos, conhecemos os
diversos rótulos de cafés produzidos na região e a aluna fez os agradecimentos
a todos os envolvidos. Entre emoção, carinho e diversos obrigados,
compartilhamos todos a gratidão de participar do projeto.
Quanto aos cegos, o que mais me marcou foi a irreverência criativa e o
humor cativante. Brincando com nossa guia, em trocadilhos com seu nome,
agradeceram pela audiência e audição.
Para finalizar, não há como não dizer da
trilha sonora, que foi escolhida pelo grupo e harmonizada no roteiro pela
Audmara. Na ida, rumo à fazenda no interior paulista, a seleção continha as
músicas de raiz, caipira e que mencionavam o café. Cantou-se “Flor do Cafezal”,
interpretada por Inezita Barroso e ecoada várias vezes pelo grupo durante a
excursão. No retorno, a opção foi MPB e chegando no desembarque, numa noite
fria e já escura, escutou-se “O trem das onze”, interpretada por Adoniran
Barbosa.
Fábio Ortolano, professor no curso
técnico em guia de turismo do SENAC ACL e participante do roteiro piloto.