segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Turismo sensorial: a curadoria por meio de um projeto integrador


Aluna do curso técnico em Guia de Turismo do Senac Aclimação, Audmara Veronese, desenvolve um roteiro sensorial para pessoas cegas e de baixa visão em Espirito Santo do Pinhal.
Atenta a escassez de produtos turísticos voltados às pessoas cegas e de baixa visão, bem como à emergência do turismo de experiência, Audmara criou um roteiro sensorial em Espirito Santo do Pinhal. O piloto faz parte de seu Projeto Integrador, idealizado no desenvolvimento das competências associadas ao profissional guia de turismo.
Unindo a Secretaria de Turismo local, que a conheceu num evento da área; empresários locais, que acolheram sua ideia em visitas preliminares, a Fundação Dorina Nowill e instituições representativas do trade turístico, como a Federação das Empresas de Transportes de Passageiros por Fretamento do Estado de São Paulo (FRESP), que acreditaram no projeto, a aluna articulou uma rede de pessoas interessadas em investir no segmento. E a experiência piloto foi um sucesso, como descreverei a seguir.
Por conviver há mais de 15 anos com pessoas cegas, Audmara imprimiu sua marca desde a idealização à implementação do roteiro. Já no início, fez uma dinâmica em que todos os participantes se apresentaram, contaram um pouco de si e do interesse em fazer um passeio para conhecer a produção de café. Vieram as lembranças da infância, os semblantes de alegria compartilhados e os causos curiosos associados à vida cotidiana.
Atenta, a futura guia descreveu como estava vestida e os adereços que escolheu para aquele passeio. Retomou as conversas iniciais de planejamento com os participantes, as histórias de cada um.
O guiamento foi uma espécie de curadoria, pois a aluna tanto se preocupou com a concepção de um roteiro desenhado pelos sentidos, como fez com que os participantes expusessem seus talentos artísticos. Um dos participantes criou algumas trovas e as declamou durante o passeio.
O primeiro atrativo foi a Fazenda Retiro Santo Antônio, apresentada por seu proprietário, Jefferson Adorno, munido da hospitalidade mais genuína. Recebeu o grupo desde a chegada do ônibus e na casa administrativa preparou uma mesa com café, leite e bolos de fubá e milho. Acolheu todos contando sua trajetória e sobre a produção de um café incluso num projeto em harmonia com o meio ambiente, pela preservação das nascentes, mata nativa e fauna local. Ali, Aud entregou as lembranças, os chapéus de palha para caminhada e comentou que havia impresso o nome de todos os participantes e apoiadores. Assim, visitamos a Capela de Santo Antônio, construída em 1950, e fomos ao cafezal. Já com a lona branca no corredor entre os pés de café, tiramos as sementes dos cafeeiros. Jefferson ensinou todos como faz a colheita, tratamento, estoque etc. E como uma surpresa, deixou que o grupo plantasse uma árvore nativa para registrar o momento. Os participantes cegos e de baixa visão pegaram na terra, tocaram o vegetal, afofaram o solo e sorriram. Dalí seguimos até a sala do moinho, onde se produz o fubá. Pegamos o milho, trituráramos e sentimos o pó que descia entre as pedras. Fomos para o almoço.
Nossa refeição foi no centro da cidade, com alguns trechos em paralelepípedo, outros com asfalto. Na paisagem, edificações históricas e bem preservadas descritas pela Audmara. Almoçamos três opções de pratos, previamente apresentados pela aluna, todos acompanhados com saladas já picadas e temperadas.
À tarde, fomos na Cafeteria Loretto. Heitor Palermo Jr., gerente do estabelecimento, arrumou uma mesa para que todos sentissem os tipos de sementes em seus estágios de maturação.  Apreciamos o café, conversamos, conhecemos os diversos rótulos de cafés produzidos na região e a aluna fez os agradecimentos a todos os envolvidos. Entre emoção, carinho e diversos obrigados, compartilhamos todos a gratidão de participar do projeto.
Quanto aos cegos, o que mais me marcou foi a irreverência criativa e o humor cativante. Brincando com nossa guia, em trocadilhos com seu nome, agradeceram pela audiência e audição.
Para finalizar, não há como não dizer da trilha sonora, que foi escolhida pelo grupo e harmonizada no roteiro pela Audmara. Na ida, rumo à fazenda no interior paulista, a seleção continha as músicas de raiz, caipira e que mencionavam o café. Cantou-se “Flor do Cafezal”, interpretada por Inezita Barroso e ecoada várias vezes pelo grupo durante a excursão. No retorno, a opção foi MPB e chegando no desembarque, numa noite fria e já escura, escutou-se “O trem das onze”, interpretada por Adoniran Barbosa.

Fábio Ortolano, professor no curso técnico em guia de turismo do SENAC ACL e participante do roteiro piloto.

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